quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Tesoura do desejo




Não sei porque cargas d'água, toda mulher, pelo menos uma vez na vida, surta e decide: vou cortar o cabelo. E se tem uma coisa nesse mundo que mexe com a sanidade das mulheres, é o cabelo.



Tenho observado que recém-casadas tem uma forte tendência a esse tipo de mudança. Não sei se é o alívio por PODER cortar o cabelo, já que antes de casar esse ato é terminantemente proibido (porque o cabelo tem que estar grande para poder fazer penteado), ou se é para a pessoa sentir que alguma coisa, de fato, mudou na vida.


Não descarto a hipótese de ser uma promessa (se eu casar, corto o cabelo assim que voltar da lua-de-mel).


Enfim, noiva é bem diferente de esposa e lá vai ela exibindo a cabeleira de "deixei de ser senhorita e agora sou jovem senhora".




Entretanto, independentemente do encalhamento ou desencalhamento (também chamado casório), toda mulher já fez uma loucura dessas. Geralmente, essa decisão se revela em pensamentos do seguinte modelo: "hum, tô precisando "dar uma mudada!"", ou "não estou aguentando essa cara de sempre", ou ainda, "nossa, quero o cabelo da Katie Holmes".


E lá vai ela (e lá fui eu), num momento de baixa auto-estima, fazer o que ninguém recomenda: uma mudança radical. Porque, nesses casos, você não sabe exatamente o que quer e deixa que o cabeleleiro realize as fantasias capilares (dele, excêntrico que é) na sua cabeça! Simplesmente, sem pensar em nada, você dá um cheque em branco e diz, inocente: me deixa linda!



Uma mini digressão, cabível nesse momento, é a seguinte: pensar que cabelo de celebridade em novela é uma coisa possível na vida real é o maior equívoco que você pode cometer. Cabelo de novela (filme ou minissérie) dá um trabalho danado, ninguém acorda com aquele cabelo. Conheço pessoas reais cuja cabeleira é tão indomável que cada tufo acorda de um jeito...


Voltando ao tema, eu, bonitona encalhada, sempre em minhas montanhas russas emocionais, não fujo a regra. Se até a Juliana Paes que, obviamente, é a Juliana Paes, já surtou e cortou, por conta própria, uma franjinha (li na Contigo!), quem seria eu para nunca ter feito o mesmo? Pois bem.


Já tive surtos pesados na adolescência, de sair de casa loira de cabelão e chegar morena com o cabelo curtinho e desfiado, que nem a Valery de "Barrados no Baile". Passei uma semana assustando toda vez que acordava e ia me olhar no espelho. Juro. Não me reconhecia, sonhava comigo de outro jeito. Enfim, foram-se os anos, o cabelo cresceu e clareou. Graças a Deus.


Meu surto mais recente começou com uma franja que minha mãe me ajudou a executar.



Preciso confessar, fiquei num visual duvidoso, alguma coisa entre paquita da Xuxa e yorkshire (mas mais para yorkshire). Minha franja espetou pra frente, ficava meio flutuando paralelamente ao meu rosto, como se fosse uma viseirinha. Bem yorkshire mesmo:De fato, o problema da franja é que, além de demorar a crescer e poder ser presa com o restante do cabelo ou atrás das orelhas, ela incomoda para atos da via em geral, tais como enxergar, escrever, ler, conversar, fazer ginástica e dirigir (imaginem, eu já sou uma ameba ao volante).


Além disso, ou você passa a mão na franja toda hora, ensebando-a rapidamente ou você faz como os yorkshires e resolve o problema com tic-tacs e presilhinhas (que são mais charmosas nos caninos que em mim):





Superado o problema inicial da franja, ela cresceu, eu esqueci o trauma, e, de novo, surtei que queria um cabelo curto, meio na nuca, e lá fui, com meu cabelão.




O cabeleleiro, muito sensível, entendeu que não devia ser radical e foi cortando aos poucos. Ele tirava dois dedos (de cabeleleiro...como vocês sabem, em dedos normais seriam uns 4) e eu lá, empolgada: mais, mais, mais!!!



Obviamente, sai do salão me achando linda (todos os profissionais presentes garantiram que eu estava mesmo). Mas foi só começar a encontrar pessoas conhecidas que as reações eram:

-Nooooossa, que mudança tão radical!

- Nooosa, que coragem!


-Nossa, você ficou tão...diferente!

- Nossa, que moderno!


Vamos combinar que radical, corajosa, moderno e diferente são sinônimos claros de "não ficou bom". Fora as pessoas que eram mais sinceras:


- Por que você fez isso?


Nada pode ser mais deprimente que essa pergunta. Ela pode ser traduzida como "por que você fez essa idiotice? ou, ainda, como "por que você decidiu ficar mais feia"? Massacrante, também, é a variável: "é bom que cabelo cresce, né?" Ou, pior ainda: "nossa, nem te reconheci". Aliás, pior de tudo é quando a pessoa, sem saber como reagir, finge que não notou.


Aí, sinceramente, dá vontade de enfiar para sempre um saco de papelão na cabeça. Inclusive, achei uns sacos próprios para essas ocasiões:



Se ninguém te contou a verdade ainda, eu conto: quando você muda alguma coisa, e fica melhor, os comentários são: "nossa, você ficou linda!", "Muito melhor assim!", "Gente, o que você estava fazendo com aquele cabelo todo?"

Toda mulher sente quando as pessoas estão sendo apenas educadas. De confiança mesmo, nessas hipóteses, só a mãe. E a minha foi incisiva:


- Vou rezar pra você porque tenho certeza que pra fazer uma coisa dessas tem alguém com muita inveja do seu cabelo por ai.


Acrescentando, horrorizada:


- E pior é que estamos bem no meio da lua minguante! Vai demorar muito pra crescer!


Além dos comentários depreciativos, você ainda tem que lidar com a ressaca do cabelo. Explico. Depois de um dia mega arrumado de salão, o cabelo acorda de ressaca, com aquela cara de "preciso de salão de novo!", mais ou menos a mesma cara de quem acorda depois de um mega casamento. E ai, amiga, é você quem vai ter que lidar com o mal humor dele, com todas as variáveis, cada mecha sofrida, ajeitar com amor.


O meu cabelo, pelo menos, é super sentimental. Fica ressentido por ter sido cortado. Se o cabeleleiro fala que vai dar uma desfiadinha, meu cabelo sussura diretamente no meu cerébro, vingativo: desfiadinha? ah, tá! Amanhã estarei exibindo cada golpe que sofri com essa navalha!

E acorda parecendo que foi picado com uma tesoura de podar jardim, tipo Edward Mãos de Tesoura.



Voltando ao meu drama, já estava arrasada, tristinha, investindo rios de dinheiro em passadores e elásticos, considerando a hipótese de um aplique, um mega hair, qualquer coisa cara e trabalhosa, quando um colega de trabalho, por acaso, sugeriu:


- Laurinha, essa revolução toda foi da tesoura do desejo?
E eu, ignorante e encucada:
- Hein?
- Tesoura do desejo, a música, ué! - e saiu.

Fui pesquisar no Google e descobri a música, que, de verdade, traduziu meu corte de cabelo. É uma música do Alceu Valença que fala do reencontro de dois ex-apaixonados. A versão que ouvi é cantada pelo Geraldo Azevedo e pela Elba Ramalho.

Pelo que entendi, o moço marca um encontro com uma antiga paixão, e fica esperando por ela, num bar do Leblon. Quando eles se reencontram, ela está com os cabelos diferentes, e ele fica vendo que ela mudou, que o tempo deles passou, que ela não pertence mais a ele.

E ele pergunta: o que que houve, meu amor, você cortou os seus cabelos? E ela responde: foi a tesoura do desejo...desejo mesmo de mudar!

A partir daí, adotei a resposta (adoro adotar frases dos outros). O que eu fiz com meu cabelo?

Não fui eu. Foi a tesoura do desejo. Desejo MESMO de mudar.

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Mais dois meses encalhada


Hoje, no meio de minhas atribuladas atividades vespertinas, olhei o calendário da minha mesa e descobri, feliz, que este blog está completando dois meses.

Sei que dois meses é praticamente nada na história da humanidade, mas, na minha história, este reduzido lapso temporal significa muito. Como tudo na vida tem dois lados, a parte ruim é que já se passaram mais dois meses de encalhamento, mas a parte boa é que os dois meses estão mais felizes, porque esta atividade tem feito minha vida mais alegre. Cientificamente.

Uma amiga minha, que é colaboradora no blog khoris.blogspot.com, fez um post muito bacana (é o do dia 30/9), confiram lá, sobre uma pesquisa que apurou que o fato de possuir um blog aumenta a felicidade cotidiana das pessoas (blogueiros).

No meu caso, isso não poderia ser mais verdade. Escrever tem me feito bem, eu consigo levar as coisas de uma maneira mais divertida, menos grave. Até o encalhamento em si considerado não está me incomodando tanto. É claro que tem dias que eu penso muito em desistir, deixar pra lá...tem posts que eu acho ruins, não sei se tem alguém me lendo, se estou sendo ridícula, mas, ai, chegam alguns comentários e eu fico feliz, repenso...e decido postar de novo. Como um vício.
Sei que não sou exatamente uma boa anfitriã, não sei direito como responder aos comentários, mas amo recebê-los. Agradeço muito aos que têm tempo e paciência de comentar minhas palavras. Muito obrigada! Voltem sempre!

terça-feira, 28 de outubro de 2008

Novena de desencalhamento

Pesquisando para o texto de São Judas, comecei a refletir. Quantos e quais outros santos poderiam atender às nossas preces? Achei um site muito interessante: http://www.cademeusanto.com.br/ que traz uma listinha de santos, cada um com sua atribuição.

Mesmo que você não seja católica, deve saber que cada santo tem uma especialidade, e, sinceramente, vocês não acreditam as especialidades que descobri! ACabei descobrindo, também, que para as várias espécies de encalhamento, há um santo específico.

Inclusive, existe uma santa cuja principal atribuição é atrair maridos! Santa Isabel!



A santa protetora das moças solteiras (eufemismo para bonitonas encalhadas, né?) é Santa Catarina de Alexandria, mas o santo protetor dos solteiros é São Teobaldo. Achei engraçado, mas deve ser porque os interesses dos homens solteiros são bem diferentes dos das moças solteiras.

Numa análise mais ampla do problema, acho que podemos considerar que, se você está encalhada, está PROCURANDO UM MARIDO. Logo, seu santo protetor é São Longuinho, o santo que ajuda a ACHAR coisas. Para ele, a oração é básica: você promete três pulinhos e três gritinhos, assim que achar um maridinho!

Se o que te aflige é a data de validade próxima, a URGÊNCIA, o santo certo é Santo Expedito, o das causas urgentes.


Contra má sorte (não conseguir um pretendentezinho sequer), São Agrícola de Avignon (esse eu não tenho idéia de quem seja, mas estava assim no site).
Contra maus espíritos (ou bonitões de mau caráter), Santa Agripina.
Contra obsessão (leia-se Mr. Big e afins), São Quirinus.
Contra problemas matrimoniais (acho que "não casar" pode ser enquadrado como um problema matrimonial), Santa Isabel (minha favorita por enquanto), Santa Rita e São Pharaildis.

Especialista em segundo casamento, Santa Adelaide.

Eu estou pensando em começar a rezar para cada um deles, todos os dias.

E, de quebra, não custa rezar também pra Santa Clara, porque, se com os outros santos der certo, é ela a responsável para que não chova no dia do casamento.


O santo das encalhadas


Pra quem sempre achou que o santo das encalhadas era Santo Antônio, uma novidade: dependendo do grau de encalhamento, nosso santo padroeiro é São Judas: o Santo das Causas Impossíveis, ou, segundo minha profunda pesquisa no google, "o santo patrono das causas desesperadas e das causas perdidas na Igreja Católica Romana".

E como hoje é dia de São Judas, apressem-se, meninas. Ainda dá tempo de fazer uma oração singela e garantir o impossível.

Se você não sabe rezar direito, segue a oração de São Judas. Identifiquei-me totalmente, por isso, mando-a abaixo. Os comentários e instruções entre parentêses são meus.

Oração de São Judas

São Judas Tadeu, glorioso apóstolo, (começa assim, enchendo a bola do santo)

fiel servo e amigo de Jesus, (continua enchendo a bola)

o nome do Traidor foi causa de que fosses esquecido por muitos, (não confunda são Judas com Judas Iscariotes!!!)

mas a Igreja vos honra e invoca universalmente (e eu invoco no meu caso particular)

como o patrono nos casos deseperados, (ai incluídas as bonitonas encalhadas)

nos negócios sem remédio. (e nos casamentos sem pretendentes!)

Rogai por mim que sou tão miserável! (sem marido, sem marido)

Fazei uso, eu vos imploro,

desse particular privilégio que vos foi concedido (já que ele tem a solução...não custa!)

de trazer viável e imediato auxilio, (um noivado, pelo menos)

onde o socorro desapareceu quase por completo. (nem ficante, nem paquera, nem pratinho!)

Assisti-me nesta grande necessidade, (de casar logo e constituir família)

para que eu possa receber as consolações e o auxílio do céu, (nada de consolos, ca-sa-men-to)

em todas as minhas precisões, (preciso de um amor, de um amigo, de um companheiro)

atribulações e sofrimentos, (na busca sem sucesso)

alcançando-me a graça de (casar),

e para que eu possa louvar à Deus convosco e com todos os eleitos, (um só eleito, no caso)

por toda a eternidade. (pois prometerei ser fiel, até que a morte nos separe!)
Eu vos prometo, ó bendito Judas,

lembrar-me sempre deste grande favor (impossível esquecer)

e nunca deixar de vos honrar como meu especial e poderoso patrono,

e fazer tudo o que estiver ao meu alcance

para incentivar a devoção para convosco,

Amém.
São Judas Tadeu,

rogai por nós (eu e todas as bonitonas encalhadas que me lêem)

e por todos os que vos honram e invocam o vosso auxílio. (mas dê preferência pra nós, que já passamos dos 26!)”


quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Teoria dos problemas líquidos

Se seus problemas fossem coisas, qual seria o estado físico deles? Sólidos, líquidos ou gasosos?



Um dia fiquei pensando sobre isso e cheguei à conclusão de que existem problemas nos três estados físicos. Foi uma descoberta muito útil na minha vida.


Em geral, todo problema nasce líquido.



É como um copo de água derramado na sua vida, ou, dependendo do tamanho do problema, um tsunami surgindo, sem que você possa segurar. Por mais que você passe um pano, a superfície atingida pelo problema fica úmida, demora um pouco pra secar. Se você não cuida dele, o problema vai escorrendo, do lugar do derramamento inicial para outras partes da vida, inundando seus pensamentos. Péssimo.


Diante do problema líquido, são duas as alternativas. Esquentar, ou esfriar a cabeça.


Se você opta por esquentar a cabeça, o que era líquido fica gasoso, e você vai achar que o problema sumiu. Só que, na verdade, ele apensa se tornou gasoso e devo advertir que o problema gasoso é o pior dos problemas, porque além de não acabar, passa a se alastrar de forma incontrolável, entrar em lugares imprevisíveis. E tudo fica mais complicado. Além disso, o problema gasoso pode feder sem que você possa fazer nada a respeito, pode aparecer no meio de um pensamento a qualquer hora do dia ou da noite, inesperado. Pode contaminar várias áreas da sua vida, sem mencionar o risco de, espontaneamente, condensar e voltar a chover em cima da sua cabeça.


Porém, se você esfria a cabeça, o problema líquido fica sólido. Congela. Fica fácil de ser localizado. Com o problema sólido, você tem tempo de analisar a situação de vários ângulos, perceber se algumas gotas respingaram onde não deviam, visualizar o contexto completo e, então, decidir o que fazer. Você pode achar cacos do problema que tinham se esvaído. Pode colar as peças. Pode guardar o problema por um tempo, entregar a outra pessoa, lidar com ele de forma muito mais prática e, por que não dizer, sábia.



Por isso, a regra é clara: sempre que tiver um problema, faça-o sólido, antes de qualquer coisa.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Jaboticabas congeladas



Amo jaboticabas. Minha avó, bonitinha, também ama jaboticabas. Para nós, é uma pena que, mesmo com todos os avanços da agricultura, só tenhamos jaboticabas uma vez por ano. É uma fruta de época.

Meu avô é uma das pessoas mais rabugentas que eu conheço. Todavia, essa característica dele não merece mais nenhuma linha desse texto. Meu avô é muito rabugento, mas ele é muito maior que seu rabujo.

Maior que o rabujo é o fato de que meu avô, Mauro, é o melhor marido que conheço. Meu pai, filho de peixe, vem colado em segundo lugar. Talvez por isso, meu padrão de qualidade para futuros marido seja tão rigoroso. Talvez a culpa do meu encalhamento seja do meu pai - e do meu avô, como Freud poderia prever.

Meu avô - e meu pai - não são afetivos, nem românticos. Não mandam flores, não escrevem bilhetes, nem presentes inesperados. Não apreciam poesias. Eles nunca querem sair pra jantar. São críticos e céticos. Têm dois pés cravados no chão.

Meu avô odeia contato físico. Qualquer ameaça de beijo é repelida instantaneamente. Ele fica sério, mal humorado, limpa qualquer vestígio - mesmo os inexistentes - de cuspe. Não aperta mão de homem.

A par de não preencher os requisitos do estereótipo de marido perfeito, é meu avô quem faz supermercado na casa, diariamente. Ele vai à padaria de manhã. Sabe o que está faltando. Procura os ingredientes mais frescos para o almoço. Compra pequenas surpresas (um bombom, um refrigerante, um canudinho de doce de leite) que me fazem uma neta muito feliz. Ele prepara o café, ajuda com a louça, pica as verduras para a salada.

É meu avô quem leva minha avó a feira todos os domingos. E busca, assim que ela liga pedindo. É ele quem olha a casa, e toma muitas providências. Ele ama a minha avó, com seus pequenos gestos. Todos os dias.

Meus avós estão casados há 54 anos. Eles têm uma casa de praia, como eu já contei aqui. Minha avó gosta de ir, ficar com as amigas, jogando buraco. Meu avó respeita, entende. Atualmente, está cansado de acompanhá-la, fica em casa, na cidade, com suas palavras cruzadas e suas muitas tarefas de todo dia. A casa fica em ordem, sempre, a espera da sua dona.

Há um mês mais ou menos, minha vó foi para a casa de praia, e as jaboticabas vieram. Meu avô, claro, comprou muitas: para mim, para meu pai, para todo mundo que chegasse.

Quando minha avó voltou da viagem, apesar de a época ter passado, ela encontrou jaboticabas congeladas, especialmente para ela, sem que ninguém mais soubesse, num cantinho discreto do freezer. Porque, na verdade, o amor do meu avô é feito dessas delicadezas e não de palavras. É feito de cuidado, respeito e carinho. É o amor maior que conheço e, apesar de ser tão grande, cabe em olhares, em observações, em suspiros. Para mim, o amor dele está em cada jaboticaba congelada.
Considerando tudo, conclui que eram para minha avó todas as jaboticabas, porque tudo o que meu avó faz inclui a minha avó. Ele sempre considera o que ela pensa e quer. Ele sabe do que ela gosta, porque ela é parte do que ele é.

E eu, bonitona encalhada que sou, acabo de descobrir o que quero. Quero alguém que seja capaz de congelar jaboticabas para mim, mesmo depois de 54 anos de casada.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

Spa pra alma




Queria ser mais leve. De corpo e de alma.


A leveza de corpo, é claro, toda mulher quer e eu não fujo à regra. Queria ser menos rechonchuda, ter menos celulites, ser mais capa de revista.


Mas a leveza de alma, essa me interessaria muito mais. Meu sorriso, quem me conhece sabe, é quase um meio sorriso. Inacabado. Não me mostro em gargalhadas soltas. Entretanto, eu queria ter um sorriso sempre esboçado, sempre começando, pronto pra se escancarar quando visse um amigo.


Queria ser leve de se gostar, queria que meus amigos e meus amores, ao se lembrarem de mim, quisessem sorrir, só de lembrar que eu sou assim, leve, avoada, destrambelhada, diferente, engraçada. Queria ser uma sensação boa, um carinho, um gosto de boa companhia. Queria ser um cheiro freso, limpo, puro, até.


Queria ser leve de papo, de amenidades, de ensinamentos com olhares e com atitudes. Queria não ter que falar nada nunca, queria ser só conforto, só colo, só cuidado, só porto seguro. Queria ser lágrimas compartilhadas, segredos guardados a sete chaves. Queria ser toda ouvidos.


Queria ser leve de tudo.


Queria começar de novo algumas coisas, e nunca ter começado outras.


Queria não carregar nada que não fosse bom no coração.


Queria não sentir essa vontade de comida pesada, de doce, de sorvete, de massa e de bife.


Queria gostar de acordar cedo e sentir o sol das primeiras horas da manhã. Queria não sentir essa fome de amar e ser amada, de saber as novidades, de receber e enviar emails. Queria realizar mais sonhos de pensamento e gostar menos de sonhos de padaria.


Queria ter persistência.


Se existissem, eu juro que praticaria exercícios diários para ser mais leve. Procuro um spa pra alma.



Chá comigo!

Uma das coisas mais importantes da fase pré-casamento é o chá de panela. É tradicional e é uma delícia. Quando alguma das noivas da epidemia de casamento que me cerca pedem ajuda, me prontifico logo: amo, amo, amo. Acho que é um dos melhores jeitos de uma bonitona encalhada sentir o gostinho de um evento matrimonial.


Ser nomeada presidente da comissão organizadora de um chá de panela é uma honra, quase uma declaração expressa de que você é a melhor amiga da noiva, ou de que, pelo menos, é uma das em que ela mais confia. Entretanto, se você não tomar os cuidados devidos, isso pode virar um problema na sua vida, na sua amizade e na sua conta bancária. Esforce-se, dê o seu melhor, surpreenda. Afinal, qualquer desencalhamento deve ser comemorado sempre.
Qualquer amor: de amiga, de mãe, de namorado, de irmão, tem essa mágica em si - a de fazer com que a gente seja realmente feliz através da felicidade dos outros. Eu sou assim. Sou feliz vendo os outros felizes. E espero que a recíproca seja verdadeira.

Porém, engana-se quem pensa que um chá é simples como...um chá com biscoitos. Nada disso.

Um chá pode ser uma experiência complexa. E traumática também. Por isso, vamos por partes:

a) A ORGANIZADORA (ou seja, você): Os requisitos para ser uma boa organizadora de chá são poucos: organização, conhecimento da noiva e dos sonhos dela, e noção. Organizadora sem noção é sinônimo de problema;


b) AS CONVIDADAS - em geral, a noiva é quem faz a lista. Entretanto, a culpa de alguém não ser convidada recairá sobre você, quer o esquecimento tenha sido intencional ou não. Esteja pronta para arcar com suas responsabilidades. Eu já esqueci de convidar uma super amiga e fiquei arrasada. Tomara que ela tenha me perdoado. Agora, realmente, tem que estar atenta a quem a noiva quer convidar. Se ela odeia a sogra, dê um jeito, se ela não suporta a cunhada, dê outro jeito, se ela evita até falar o nome de uma das amigas do noivo, vire-se. Como no casamento, organizar chá é estar do lado da noiva, na alegria e na tristeza. Na etiqueta e nas gafes.
É importante que a organizadora conheça - e bem - o perfil das convidadas. Decisões estratégicas tem que ser tomadas nesse item, saber se a sogra e a mãe vão comparecer, se elas vão aceitar as brincadeiras numa boa, se algumas das convidadas são de mal...enfim, não há limites para o número de convidadas, depende muito do que a noiva quer, do tamanho do casamento, das amigas...muitas variáveis mesmo;
c) OS COMES - ninguém vai querer se empanturrar. Sugiro comidinhas leves, sanduichinhos, salgadinhos, coisinhas de mulher. Como 80% das convidadas estará de regime para caber no vestido, é bom que haja opções light. Obviamente, isso não sinifica que os docinhos sejam facultativos. Não são. Aliás, um bolo lindo sempre conta pontos e enfeita.

Agora, no quesito bolo, se você for fazer uma coisa bonitinha, preste atenção nos noivos. No último chá que fiz, encomendei um bolo com dois bonequinhos, lindo de morrer:




Só que, apesar de ter avisado que o noivo era bem moreno, a confeiteira economizou no chocolate e ele saiu amarelo. Brinquei dizendo que ele estava de hepatite, mas foi sorte. Imagina fazer um bonequinho loiro? Ia parecer que eu estava desejando um adultério pré-nupcial. Ai que horror!

d) OS BEBES - chá que se preze serve todo tipo de bebida, menos chá. Suco, refrigerante, água. Cerveja, chopp, espumante (se o orçamento permitir), caips. Para a noiva: cachaça e tequila. Muita.

Até agora, tranquilo, né? Então vamos aos pontos problema.

e) AS BRINCADEIRAS - é nesse momento que a noção se faz indispensável. Há milhares de sugestões na internet, mas não custa pensar (momento de reflexão) sobre o que é verdadeiramente engraçado e o que é absurdamente constrangedor. Exemplo real de prenda inadequada vista por mim ao vivo? Mandar a noiva simular sexo oral com o cabinho do rodo de pia. Ninguém precisa disso. Se eu, que era conhecida, achei que não precisava, imagina a MÃE E A SOGRA...

Também recomendo evitar perguntas que possam deixar a noiva sem graça. Exemplo? Já repararam que a parte da noiva que o noivo mais gosta é sempre "os olhos"ou "o sorriso". Nào dá pra ser sincero nesse momento.

Dançar o créu, a dança do quadrado, alguns funks, acho válido. Não convém forçar ninguém a nada. Vestir de noivinha, maquiar toda borrada, pedir dinheiro na rua, dublar a Xuxa ou a Britney, enfim...


f) OS PRESENTES - Gente, eu sei que está em desuso mulher na cozinha. Todavia, os presentes vão depender muito do que sua amiga já tem (se ela já morar com o marido deve ter quase tudo) e do que ela quer. Uma opção é fazer um chá de lingerie, que eu acho lindo, mas ai, fica a critério seu (repetindo: da organizadora com noção que você é).

g) OS RECURSOS PARA BANCAR A FESTA - Dinheiro é sempre delicado. Conheço três opções: as madrinhas bancam a festa e as convidadas levam os presentes, as convidadas e as madrinhas dividem tudo e as madrinhas compram todos os presentes ou a noiva promove a festa e as madrinhas cuidam da organização e dos presentes.
Apesar de ser meio chato e, às vezes, constrangedor, dê um jeito de ter certeza absoluta de quantas pessoas vão, e de que elas vão pagar (se esse for o combinado), porque é muito comum o chá de panela dar um prejuízo horrendo. A menos que você disponha desse capital para doação, planeje-se. Faça as coisas por sua conta (evite contratar bufês), fazendo todas as contas necessárias.

Então, ai estão as dicas sinceras e objetivas mais importantes para organizar um chá. Agora, se você quiser idéias maravilhosas de decoração, quitutes, lembrancinhas, firulas em geral, a internte tem um monte. Com todas essas facilidades, da próxima vez que uma amiga sua casar, você tomar as rédeas do evento e falar, orgulhosa: seu chá? Chá comigo!

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Mini-caso


Preciso contar um mini-caso. Meu e verídico.

Estava paquerando um bonitão que acabara de conhecer. Lindo. Muito mesmo.

Já tinha bebido umas cervejinhas, estava assim, leve, leve, leve...

De repente, tive que ir embora, não me lembro direito o motivo. O menino pediu meu telefone.

Anotei num guardanapo:

Laura H
Residencial (xx)xxxxxxxxx
Comercial (xx) xxxxxxxxx
Celular (xx) xxxxxxx

Com tantas informações, porque será que ele nunca entrou em contato?

Organização amorosa




Se você é uma bonitona encalhada bem sucedida, precisa ter um certo nível de organização, pra não ficar perdida entre os diversos pretendentes (presentes, pretéritos e futuros, ou seja, todos aqueles que te pretendem, pretendiam e ainda pretenderão).


Em outras palavras, quando tudo o que você tem de mais concreto são possibilidades de um relacionamento duradouro, e ainda não sabe em qual deles deve investir, manter os pratinhos girando é a tática mais recomendada. Obviamente, casos como esses demandam não só uma memória de elefante (e espero, do fundo do meu coração, que apenas sua memória seja paquidérmica, jamais seu corpinho) e um celular com memória suficiente para mais de 10 anos de paqueras (porque, vamos combinar, bonitona encalhada só depois dos 25, né?).


Considerando que poucos acontecimentos na vida são mais desagradáveis do que atender a um telefonema sem ter a menor noção de quem te ligou (especialmente quando a pessoa do outro lado nem desconfia disso), é bom que você tenha uma estratégia prática e objetiva.


Então, se você dispõe da maravilha tecnológica privativa e particular (imaginem a vida das bonitonas encalhadas antes da telefonia móvel!) com identificador de chamadas, considerando que seus pretendentes serão inúmeros, mas os nomes masculinos não são, você vai ter que dar um jeito de ligar o nome à coisa, ou melhor, ao coiso que te liga. Afinal, João, Ricardo, Bernardo e Marcelo não são nomes exatamente únicos e exclusivos (como seria o caso de um Allan, ou de um Stefano), e o risco de você conhecer dois "homônimos" é alto. Como fazer?
É importante que a classificação adotada tenha um critério objetivo e único para todos. É uma péssima idéia escrever Fulano Lindo, se você acha vários dos seus paqueras lindos, ou simpáticos ou beijo-bom ou tudo de bom (TDB).

Uma amiga minha (podem acreditar, não sou eu, juro!) resolveu de vez a questão: acrescenta, logo depois do nome do bonitão, o lugar em que se iniciou affair. Com isso, ela resolve dois problemas de uma vez só: problema um - identifica o sujeito e, problema 2 - já tem um contexto pronto para a conversa. Afinal, os assuntos a serem abordados com João Axé são completamente diferentes daqueles a serem tratados com Lucas Rave e Bernardo Sushi Lounge e, certamente, bem distintos do que os debatidos com Marcelo Pós Graduação e Ricardo Sertanejo.







É claro que você corre o risco de, aos poucos, ver seu celular transformado num mini-guia de baladas da cidade, tipo aquelas edições da Veja cidades, o que, pensando bem, é bom, porque significa que você circula, se diverte e está encalhada porque, enquanto não sai casamento, você pelo menos está curtindo bem seu encalhamento.


A técnica é praticamente imune a riscos. Identifiquei dois: o desagradável hábito de alguns espécimes masculinos que insistem em usar um "número privativo" e o caso de você, num momento de fúria, solidão, desapego, memória cheia do aparelho, ou todas as alternativas anteriores, ter desativado o número de um pratinho, que, do nada, resolve rodar de novo. Vamos combinar, tem pratinho que é de metal ou de plástico, como os pratos de criança. Além de serem da pior qualidade, insistem em não quebrar nunca.


Outra consideração relevante é nunca, jamais, em tempo algum, ceder à tentação de colocar, simplesmente: não atender 1, não atender 2, não atender 3, para aqueles que merecem ser deletados. Como disse, pratinhos estão sempre girando, o mundo dá muitas voltas e, recuperar o telefone certo no meio de tantos números é praticamente impossível. Além de constrangedor. Imagine a cena: você fala pro moço que perdeu o telefone dele, que a memória do celular apagou, sei lá, uma desculpa qualquer. Ele, o paquera que estava desativado, sugere te dar um toquinho. Você pega o aparelho e, bem na frente do paquerildo, surge um "não atender 26". Não dá.


Além disso, tratando-se de telefone celular, você sempre pode ignorar as chamadas, por a culpa na operadora, cantar a musiquinha da Oi: "quem ama bloqueia/ quem ama bloqueia". E, se quiser ser mais clara, sem precisar falar nada, é só dar um end. Nas chamadas e no relacionamento.



quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Ex-namoradolândia

Se o relacionamento fosse perfeito, o ex nunca teria se tornado ex. Quem alcança essa condição sempre tem uma dose definitiva de merecimento. A partícula "ex" denuncia que algo não deu certo.

Ou ele te amou demais (ou de menos), ou te procurou demais (ou de menos), ou te respeitou demais (ou de menos). E não é pra mais (nem pra menos) que aquele ser estranho, misterioso e desconhecido, saiu da sua vida num legítimo acordo de Taubaté firmado entre as partes (alguém entrou com a bunda - tomara que ele - e alguém entrou com o pé - tomara que você).



Pois bem.

A teoria utópica (mais uma teoria) é de que todo ex deveria ser automaticamente teletransportado para as geleiras afastadas do pólo sul ou, melhor que isso, mandado de foguete para o distante planeta conhecido como Ex-Namoradolândia, um lugar ermo e deserto habitado apenas por ex-namorados do sexo masculino, desprovido de qualquer docilidade - e de qualquer mulher.

Fico pensando que a ex-namoradolândia deveria ter uma emissora de tv que só transmitisse filmes de guerra e notícias de esportes (sempre com a simpática voz de Galvão Bueno e as insuportáveis mesas redondas eternas, de preferência) e, para alguns poucos, filmes cults, muito cults e livros igualmente cults que não deixassem um minuto de relaxamento na vida. Ah, e Bloomberg, claro.


Um lugar onde não houvesse comédias românticas, novelas, chocolates e tpms, nem nada daquilo que compõe o universo de uma namorada...

De hora em hora, ecoariam por todo o planeta, trechos básicos usados por todo ex-namorado, naquele momento crucial em que decidem se tornar ex... Seriam ouvidos discursos como "eu não estou pronto para um relacionamento maduro agora", "se fosse para namorar era com você", "precisamos ter outras experiências para ter certeza de que é isso mesmo (no caso, nós mesmas) que nós (leia-se eles) queremos", "não vou ser o namorado que você merece" e blá, blá, blá...

Enfim, uma infinidade de papos furados que, não só não diminuem nossas tristezas ou reduzem nossas angústias e ansiedades, mas que também tem a poderosa função de nos manter "no balaio"... Você liga, na maior fossa, e ele te nunca te atende, ou, pior, fica mostrando pros amigos a tela do celular piscando seu nome, como se você fosse uma louca desesperada. Ai, entra no carro, saindo da balada, e te retorna as ligações, com voz de neném?

Amigas, sejam fortes: não atendam os telefonemas, saiam fora, de verdade.
De todos os tipos de ex, o que eu mais abomino é o que precisa de um tempo pra pensar (quanto tempo, meu Deus?)

Quer pensar? Então vá fazer um retiro com os monges castos do Tibet! Sete anos, no mínimo. E se, ao final dos pensamentos, ele chegar a conclusão de que não te quer? Você tem que esperar essa pensação toda?

Os amigos dele contam que ele te ama? Daquele jeito estranho de amar que inclui carnavais temporões, festas do peão de boiadeiro, calouradas, formaturas de 3º ano de mil e cinco colégios, de faculdade, e até bailes de debutantes, mesmo sendo ele mais de uma década mais velho que as aniversariantes? Não serve...

Claro, você tem uma amiga que já te falou isso tudo que eu estou escrevendo. Só que, o infeliz te liga sempre quando está bêbado, e vc interpreta isso como sendo a oportunidade que ele tem de esquecer o orgulho? Não se iluda, ele pode estar voltando de uma balada fracassada e estar te ligando para garantir o que ainda não conseguiu (uns amassos eficientes)...

Ele te liga chorando, diz se arrependeu amargamente de todas as bobagens que fez enquanto vocês estavam namorando e que te tiraram do sério a ponto de nunca mais querer ouvir o nome da figura? Emagreceu 20 quilos? Não dorme há três meses? Pois que coma bastante e tome soníferos, você não serve para engordar nem para adormecer ninguém!

Enigma que assola a humanidade: porque os homens pensariam nos caminhos da vida em meio a turbulência de intermináveis gandaias, se não conseguem pensar durante a tranquilidade e estabilidade de um namoro?

Infelizmente, sei que a maioria de nós identifica o problema quando acontece com as amigas, mas, quando chega a nossa vez... lá vem o auto-engano (comigo é diferente, eu "sinto" que ele está sofrendo"). Cuidado, seu sensor pode estar quebrado...

Ex-namorado só existe e a ex-namoradolândia só não existe porque todo mundo precisa de uma segunda chance e, se todos os ex fossem exilados, não encontraríamos mais nenhum homem maior de 18 anos na face da terra com quem pudessemos iniciar uma nova história. Por isso, deixe seu ex pra próxima, a fila tem mesmo que andar, pra ambas as partes. Se eventualmente, vocês se reencontrarem daqui a uns anos (anos, viu?), certamente serão duas pessoas completamente diferentes das que eram, e ai, dependendo, pode ser que venha a valer a pena.

Porém, mantenha seu radar ligado e faça sua própria ex-namoradolândia abranger um raio de pelo menos 10km do ar que vc respira. Sempre.

Na minha humilde opinião, quando visualizar o infeliz, imagine-o com a caveira de perigo no pescoço e com a placa: Mantenha distância.


terça-feira, 14 de outubro de 2008

Um coração pelo caminho


Quando eu era pequena, um dos meus maiores medos era ter doença de Chagas.

Na casa de praia de minha avó, havia sempre uns barbeiros, verdes e fedorentos, e eu ficava preocupada de que me deixassem aquela doença misteriosa que, meu pai havia me explicado, deixava o coração gigante. Havia, na casa de praia, também lagartixas e besouros, formigas, abelhas e lagartas, mas nenhum criatura era tão temível, para mim, quanto o barbeiro. Às vezes, eu acordava de noite, com medo de ter sido picada. Afinal, era só coçar o local que a doença poderia instalar-se.

Outras vezes, durante o dia, sentia meu coração crescendo. Às vezes, quando corria, sentia o coração gigante, aos pulos. Pior que isso era senti-lo batendo em outros lugares, latejando no olho, no rosto, na barriga depois do almoço. Isso, para mim, não era uma sensação, era a certeza de estar doente, e acho que certeza infantil é a maior de todas as certezas.

Então, nesses dias, eu ficava quieta, e deitava na rede para ler e esperar meu coração diminuir. Não pulava corda, não brincava de nada, esperava, pacientemente, sentir que o coração estava menor. Ficava pensando no nome daquela doença, porque, como fazem as crianças, perguntei a meu avô o que era chagas (sem explicar que a dúvida se referia à doença) e ele disse que chagas eram cortes que sangravam. Claro que a explicação me satisfez e aumentou meu medo, pois demorei a saber que Chagas era de Carlos Chagas, o descobridor da moléstia (aliás, mini-reflexão, que coisa estranha a pessoa virar nome de doença, né?).

Agora, passados alguns anos, não tenho mais sentido o coração crescer, mas ainda há dias em que eu acordo e simplesmente sinto meu coração diminuiu. Porém, já tendo afastado a hipótese das chagas, acho que ele está diminuindo mesmo. Meu coração é um coração em pedaços, um coração em chagas.

Descubro, invariavelmente, em dias como esse, que as chagas foram todas feitas por mim e que meu coração ficou pelo caminho.

Descubro que fui entregando meu coração a muitos, aos poucos. Que, a cada dia, tem gente que ganha mais um pedaço, e gente que deixa o pedaço que ganhou em qualquer lugar. Que já não sei quem são exatamente essas pessoas, e que não adianta me preocupar com isso.

De qualquer maneira, quando encontro alguém que anda por aí com um pedaço do meu coração, sei de imediato. Sei pelo olho, sei pelo tom de voz, sei pelo sorriso, pelo esboço de cumprimento. Procuro essas pessoas, que me salvam de embaraços, que fazem com que lugares constrangedores e hostis sejam mais amenos, que ouvem meus desabafos, que me surpreendem com os seus.

Sei as pessoas que têm meu coração. Talvez porque também elas tenham me deixado um pedaço do coração. Talvez porque estejam cuidando diariamente do que receberam e, quando reencontro outra parte – da qual nem eu mesma me lembrava, faz com que sinta meu coração maior. Talvez porque elas mereceram um pedaço do meu coração, e vão continuar merecendo. Talvez porque elas nunca tenham pedido, talvez porque nem saibam que ganharam, talvez porque simplesmente são quem são.

Felizmente, há pessoas a quem eu entregaria meu coração inteiro, se pudesse. E outras a quem eu pediria licença para retomá-lo, dizendo, laconicamente, “acho que eu cuido melhor dele que você”...

De qualquer modo, é estranho sentir que você deixou seu coração pelo caminho. E mais estranho ainda é se conhecer a ponto de saber que, sendo eu quem sou, continuarei deixando-o pelo caminho, inevitavelmente, todos os dias, até que o coração se acabe.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Estagiários

Entre tantos e tantos tipos profissionais, e considerando que, hoje em dia, não há nada demais em se envolver com um homem mais novo, é bem possível que, no meio do seu caminho, surja um estagiário. Você está, empolgada com um paquera e descobre que ele "só" estuda.

Estagiários são aprendizes de alguma profissão, o que nem sempre significa que sejam aprendizes no tato e táticas para lidar com mulheres. Aliás, não são raros os casos de amigas que se envolveram com meninos e se surpreenderam com o profissionalismo e maturidade dos que elas julgavam serem meros iniciantes.
Já que no último post abordei o tema "bolsa de valores" e, como também já contei aqui, estudei bastante o assunto, para fins amorosos, posso dizer com segurança que, para nós, bonitonas encalhadas, estagiários costumam ser investimentos de altíssimo risco, longuíssimo prazo e pouco retorno. O que não significa que devam ser sumariamente descartados. Só que, em se tratando de um investimento complexo, várias características devem ser levadas em conta.
Digo de cara: as saídas podem ser interessantes, mas, dependendo do período (da faculdade) em que seu estagiário se encontrar, e da sua vontade de desencalhar, melhor nem ler o currículo, nem chamar pra entrevista. Por isso, elaborei uma lista, para imprimir e colar no armário, sobre as desvantagens de optar por esse tipo de bonitão.
Desvantagens de se envolver com um estagiário:
a) Ele certamente ganha pouco. E isso vai se prolongar até que ele deixe de ser estagiário. E o pior, recém-formado também sofre, até ter alguma segurança financeira, vai demorar uns dois anos, depois da formatura, pelo menos. Então, não me entendam mal, por favor. Nem pensem que sou uma interesseira candidata a dondoca. Mas um estagiário, em geral, recebe entre um e dois salários mínimos por mês. Sei que o Brasil é um país de muitas diferenças sociais, que muitas famílias se sustentam com isso. Mas é que, se o plano é desencalhar, essa condição econômica vai ser usada contra você, como um argumento muito consistente, diga-se de passagem.
b) Além de ganhar pouco, ele vai ter que vender muitas coisas durante a faculdade. Canetas, mouse-pads, agendas, rifas, tudo isso em prol da famigerada comissão de formatura. Por isso, além de não ter com quem dividir as contas, você ainda será surpreendida com gastos-extra e eventos-mico, do tipo "festa à fantasia da Comissão".

c) O estagiário não necessariamente é um homem mais novo. Ele pode ser da sua idade, até mais velho. Ele pode ter demorado a passar no vestibular. Pode ter ficado na dúvida entre dois, três e cinco cursos. Ter começado alguns e desistido. Porém, fique atenta para o fato de ele não ser um profissional do ramo, ou seja, um ativista estudantil que corre o risco de ser jubilado a qualquer momento.
Se o seu pretendente corre o risco de daqui a pouco ele vai ser confundido com outras pessoas eternas da faculdade (o moço do xerox, o servente da cantina) pelo tanto que é visto nas imediações, se ele é tão irregular que alunos de todos os períodos o cumprimentam, corra dele.
A menos que ele tenha outra ocupação além de estudar, que já desenvolva com alguma independência outra atividade, se tudo o que seu pretendente quer é jogar truco nos intervalos e angariar votos para a chapa 2 do DCE, por favor, mantenha distância.

d) O estagiário costuma sair durante a semana, porque os amigos dele ainda estão nessa fase. E isso significa sair segunda, terça, quarta, sem discriminação de local bairro ou gênero musical... Ele vai curtir micaretas, sertanejos, raves, pagodes e forrós - sem dispensar o estádio de futebol com os amigos - com igual intensidade e é bom que você também tenha fôlego.

e) O estagiário ainda vai encarar a fase "eventos de formatura só para formandos", com todas as coleguinhas embriagadas que ele paquerou o curso inteiro. Você sabem, época de formatura é tumultuada em qualquer namoro, baile então, nem se fala. Prepare-se para aguentar. Yoga, tai chi chuan e meditação budista serão técnicas altamente recomendadas. Até um grupo de auto-ajuda.

f) O estagiário pode ter uma chefe bonitona encalhada super legal e descolada, que não terá escrúpulos em usar da sua condição de chefe para colocar o trabalho em primeiro lugar na vida dele. Inclusive, ela pode usar táticas como mensagens ao celular para "happy-hours" no boteco do lado do trabalho e nada poderá ser feito por você para impedir. Nem pense em aparecer de surpresa. Você vai ter que relaxar e confiar.
g) O estagiário é atleta da faculdade, e se valerá dessa condição para ir nas excursões intermunicipais e interestaduais que, como notoriamente se sabe, são mera desculpa para beber-cair e levantar. Ah, e claro, dar umas paqueradas. Medicina e direito lideram: praia-med e direito-folia são um suplício para qualquer namorada de estagiário desses cursos. Mas não se iluda. Todo curso superior tem um evento do mesmo tipo: alojamentos, vinho de garrafão e pesadelo para a namorada que fica em casa.
Agora, já que nem tudo serão espinhos, vão as vantagens de um estagiário na sua vida:
a)Estagiários sempre se interessarão pelos seus casos de trabalho.
b)Estagiários têm fôlego, disposição e bem menos preocupações que um profissional, ou seja, o risco de um mal humor grosseiro para o seu lado é menor. Além disso, aceitam ordens melhor que os outros.
c) Estagiários ainda têm capacidade (e tempo) de serem românticos, e te mandarem bilhetinhos e emails só para dar oi.
d) O estagiário é um ser em formação, ou seja, ainda dá tempo de você dar uns toques pessoais e deixá-lo do seu gosto.
e) É muito mais fácil matar um dia do estágio (quando você puder dar uma fugidinha com ele) do que do serviço.
E, agora, relendo a lista das desvantagens...fiquei pensando. Qual homem, por mais velho que seja, formado e bem sucedido, não tem pelo menos uma dessas características? Sem contar os inúmeros marmanjos que tenho conhecido e que simplesmente se recusam a crescer e a assumir responsabilidades.
Logo, só posso concluir que, assim como o encalhamento é um estado civil, ser estagiário é um estado de espírito, é um jeito de encarar a vida, de se portar. Tem cara que simplesmente não se dá conta de que o mundo está girando, e fica lá, na dele, estagiário da vida, pra sempre.
Então, pesando os prós e os contras, acho que vale a pena dar uma chance pro estagiário (que ainda está na faculdade) na sua vida. Nem que seja só um estágio.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

O pregão da bolsa


Já que a bolsa está uma loucura essa semana (e não a bolsa da Louis Vuitton, que é sempre uma loucura, mas a bolsa de valores), resolvi desenterrar um caso.

Naquele tempo (porque o affair é bem antigo, quase bíblico), eu estava meio traumatizada com os cabeças vazia que encontrei pelo caminho, e me interessei por um playboyzinho, mauricinho, engomadinho. Bonitinho e cheirosinho, claro.

O meu paquerado era engenheiro, mas bem que podia ser advogado, administrador, economista, consultor ou alguma outra coisa desse ramo de negócios numéricos e burocráticos e bem-sucedidos, ou seja, pertence a primeira categoria de profissionais a ser analisada.

Então, estava eu solteira (leia-se, sem namorado), pela primeira vez em muitos anos, e eis que me surge um bonitão encantador, cheio de assuntos interessantes: economia, bolsa, mercados, enfim, um cara intelectualmente superior. Pelo menos à primeira vista.


Quando ele me chamou para sair, foi um surto. Até palpitações eu senti, não sabia o que vestir, o que passar no rosto e, pior, o que conversar. Foram uns dois dias de intensos estudos econômicos, comprei até um guia sobre a bolsa para mulheres e, munida de muita informação, tive uma noite agradabílissima. Que rapaz encantador, que papo interessante! Economia, bolsa, mercados, enfim, um homem do mundo. Lembro-me que, naquela ocasião, achei ótimo que o moço não tentou nada, nem um beijinho de despedida. Aliás, estranhei um pouco, mas, como eu estava ainda abalada com o término, achei melhor assim.

Empenhei-me no estudo das siglas e termos estrangeiros: IPO (que eu só gravei porque pensava Isso Pode ser Ótimo), ON, PN, comoditties, due dilligences, home brokers, muita informação.

Como eu suspeitava, ele tinha gostado do encontro, me chamou para repetir a dose.

Mais dois dias de estudo pesado. Considerando que, no primeiro papo ele tinha me indicado algumas publicações, comecei o dia pelo site do Valor Econômico, passei pelo do The New York Times e ainda, no salão, fiquei folheando a Isto É Negócios...Queria ter muito assunto, parecer interessante e interessada nos assuntos de gente séria.



Saímos de novo e nada, niente, nothing. Papo vai, papo vem, comentei todas as notícias, até discorri sobre o balanço de um banco (que eu havia lido) e a repercussão ds resultados no valor das ações, mas o pretendente pretendido nem esboçou nenhuma vontade de encostar em mim, tão envolvido nas nossas conversas. Economia, bolsa, mercados, aquele era um homem do mundo - dele.

Já estava achando ele meio autista, monotemático. Fiquei preocupada quando ele me contou que só assistia Bloomberg. Quem, no mundo, só assiste Bloomberg?

Todavia, quando meu celular tocou pela terceira vez, me convidando pra sair, não resisti. Agora era uma questão investigativa. Até onde esse enigmático ser iria?

Mais uma vez, nadica de nada. Quer dizer, me aprofundei em alguns temas e me lembro até de ter discutido sobre a política de controle de natalidade da China e da Índia; a necessidade de superávit primário na conjuntura da crise; a aplicabilidade das regras do BID e do FMI, o papo prosperava, mas a paquera estava completamente parada, ele só queria conversar. Pior que isso, ele não mudava de assunto, não relaxava, não dava trela...Ele era muito profissional.

Eu já estava exausta de tanto papo e tanto estudo, nem queria saber mais de nada. Esperava, na melhor das hipóteses, que ele me desse um diploma e me dispensasse. Desci do carro indignada. Preferia que ele sumisse, e que sumissem também as bolsas, a economia, e os mercados...

Entretanto, estava também intrigada. Será que, para ele, paquera era como um processo de seleção de trainees, em várias etapas? Será que eu havia sido eliminada? Já me imaginei participando de "O aprendiz", com o bonitão (de cabelo estilo Donald Trump) na mesa: - Laura, você está demitida...

Porém, para minha absoluta surpresa, o moço me liga de novo, e, pela quarta vez, como eu não tinha nada para fazer, resolvi sair. Óbvio que testei todas as variáveis possíveis: hálito, maquiagem, roupa, cabelo. O quadro interno estava em ordem, a conjuntura era favorável, mas, às vezes, o problema vem de fatores externos, e esse me parecia o caso.

O encontro parecia uma arguição, uma entrevista de emprego. Por fim, até que a paquera deu um resultadinho, mas nada comparado à euforia dos IPOs. Aliás, depois de quatro longos encontros, aquilo foi mais uma prestação de contas aos investidores do que uma distribuição de dividendos. Acho que cai na enganação da bolha especulativa: superestimei o potencial, investi mais que devia e, na apuração dos resultados, o déficit ficou evidente.

Por fim, ele disse que eu era inteligente demais pra ele fazer comigo o que fazia com as outras, e que, como não queria nada sério, preferia ser meu amigo, porque, afinal, eu era a única mulher com quem ele gostava de conversar, e isso me fazia única no mundo. Para minha auto-estima, preferi acreditar. Em outras palavras, ele não estava acostumado com mulheres com mais de dois neurônios e, por isso, mereceu o apelido que minhas amigas deram: o "pregão" da bolsa.






Pretendentes profissionais

Uma dica que eu queria dar há mais tempo, mas não tive oportunidade: a profissão é muito relevante quando se está em processo de recrutamento de pretendentes. Acho errado rotular as pessoas, não gosto muito de rótulos, mas que a profissão pode dizer algumas coisas a respeito da pessoa, disso ninguém pode discordar.
Assim, quem está naquela fase crítica de triagem de paqueráveis, tem que prestar atenção nas características gerais e nos detalhes, avaliar mesmo. Como se fosse um provão das profissões.
Infelizmente, para nós e para eles, aos dezesseis, dezessete anos, a gente escolhe uma coisa que vai nos definir pra sempre. Depois que a gente forma, a gente passa a SER alguma coisa. E eu, que adoro ser muitas, acho péssimo.

A profissão é uma característica básica. Via de regra, quando alguém for te apresentar para outrem, vai dizer: de onde te conhece (se você é amiga, conhecida, irmã de fulano), e o que você faz da vida. É batata (como diz Nelson Rodrigues)!


Então, é como se o diploma incrustasse na sua alma um índice de características, só pelo que você estudou por alguns poucos anos. Por isso, quando você responde qual a sua profissão, as pessoas saem deduzindo várias coisas a seu respeito, sem autorização, nem qualquer dado fático para isso. Simples e estereotipado assim.


Agora, já que a gente não muda o mundo, e as profissões vão continuar existindo sempre, preciso contar uma coisa, tipo um desabafo: eu fiz uma classificação dos homens de cada profissão, listando as principais características.


Meninas, sejamos francas, a profissão pode te dar muito mais informações úteis que a astrologia, por exemplo. Muito mais fácil prever que um personal trainer não combina com uma hostess de boate do que ter certeza de que um libriano com ascendente em leão não combine com uma sagitariana com a lua em touro.


Assim, como no horóscopo, minhas previsões são assim, genéricas (e talvez um pouco duvidosas), mas vocês podem usar se e quando quiserem. Além disso, todas elas baseiam-se em fatos reais. Garanto que não fazem mal à saúde.


Só que, como este texto estava ficando muito grande, vou dividi-lo em vários.


Aguardem o próximo post.


terça-feira, 7 de outubro de 2008

Sapos ou princípes?

Hoje estou com um enigma Tostines na cabeça. Aliás, faz uns dias que ele me assombra, mas estava sem tempo para redigi-lo como ele merecia ser redigido.

Pra quem não é da minha geração, devo dizer que enigma tostines é um desses enigmas similares ao da galinha e do ovo. Sabe? Quem veio primeiro: o ovo ou a galinha? É que, antigamente (nem tão antigamente, há poucos ans quando eu ainda era criança), fizeram uma propaganda de biscoito que perguntava: Tostines vende mais porque está sempre fresquinho, ou está sempre fresquinho porque vende mais?

Então, o enigma Tostines do dia é: na vida real, o sapo é que vira princípe ou o princípe que vira sapo?
Explico. Frase shakesperiana do dia: O sapo é um sapo, bem sapo, com todas as sapices sapológicas. Ninguém quer, em tese. Porém, todo sapo merece um crédito. Ele é super sincero, espontâno e transparente. O sapo mostra logo a que veio. Arrota, come mosquito, dá seus pulinhos para lá e para cá, coaxa a noite e gosta bem da sua fêmea. Não vou dizer qual é a fêmea do sapo pra não baixar o nível do texto, mas não é a rã, tá bem?
O problema todo é que a gente não passa a vida inteira esperando o sapo. A gente espera o princípe.
Por mais que exista a lenda de que, nos contos de fadas, o sapo vira princípe, eu não conheço nenhuma historinha em que isso aconteça. Não é com a Cinderela, não é com a Branca de Neve, não é com a Pequena Sereia, nem com a Aurora (Aurora é a Bela Adormecida). Talvez a única que tenha uma versão próxima de sapo seja a Bela (da Bela e a Fera, que, por sinal, é a minha preferida). Só que a Fera é bem mais interessante que um sapo. Com sapo, sapo mesmo, nenhuma.
Então, temos todos os motivos pra sempre sonharmos com os princípes. E sonhamos. Muito.
Só que, na minha experiência pessoal, o que tem de princípe virando sapo por aí, não está no gibi (hoje estou resgatando expressões dos anos 80!)
Voltando às histórias infantis, acho válido notar que quando o princípe só aparece, quando a história acaba. A princesa sofre, sofre, sofre. E é sempre na hora do "e viveram felizes para sempre" que o bendito princípe chega. Será que o sapo estava lá, escondido na folhagem (princesa sempre passeia pelo bosque) o tempo todo?
Entretanto, na vida real, não é bem assim. Pelo contrário, é quando chega o princípe que as coisas começam a piorar.
Sejamos justas. Coitados dos princípes. O moço chega na sua vida (e na sua imaginação) com uma baita responsabilidade. Ele já é perfeito. Só que tem que lutar, todo dia, para manter-se perfeito, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, na feiúra e na beleza. E ninguém é tão perfeito assim. Nem eu, nem você, nem Gisele (a top, não a ex-BBB, por favor!). Por outro lado, o princípe se acha perfeito, se sente bem no pedestal que você o colocou, ou seja, pra ele começar a te lançar olhares superiores é um pulo. E de pulo em pulo, ele vira sapo. Pra sempre.
Já o sapo...ah, o sapo já é um poço de imperfeição e só tem como melhorar. O sapo chega e a gente só dá uma olhadinha de descrédito. Ninguém deposita grandes expectativas no sapo, e para ele um beijinho da princesa - que você é - vai fazendo grandes transformações, dignas da abobóra-carruagem. Todo sapo que acha uma donzela disposta a investir nele começa a mostrar o seu melhor, a mudar um pouco o jeito, a ceder em algumas coisas (principalmente em coisas de higiene pessoal).
Outra coisa boa do sapo é que ele é bem menos assediado, você é única pra ele: princesa, como você, de fato, é.
Na verdade, acho que tenho um quê de sapo-fêmea.
Acredito, espero e sonho que o amor vá me transformando em princesa. Aos poucos...
PS: Pra terminar esse post, a notícia que o inspirou. A nova moda das noivas é, em vez do tradicional buquê, jogar sapos de pelúcia pras amigas. Já estou sonhando com o meu. Juro: http://www.lavemanoiva.com/portal/index.php?option=com_content&task=view&id=192&Itemid=75

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

O menor (e melhor) conto de fadas do mundo - uma introdução ao próximo post

Recebi por email, autoria desconhecida, mas bom para começar a semana:









Era uma vez uma bela moça que pediu um garoto em casamento:

- Você quer se casar comigo?

Ele respondeu:

- NÃO!

E a moça viveu feliz para sempre, não teve filhos, viajou, conheceu muitos outros garotos, fez plásticas, não lavou louça nem fez jantar, visitou muitos lugares, sempre estava sorrindo e de ótimo humor, nunca lhe faltavam pretendentes, ia e voltava na hora que queria, saia pra jantar com as amigas sempre que estava com vontade e ninguém mandava nela.

O garoto ficou velho, careca, barrigudo, engordou, e ficou sozinho....



FIM

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Quem tem medo do Mr. Big?

Passado o casamento, mais recente, voltemos aos posts nossos de cada dia.

A pergunta que não quer calar é: quem tem medo do Mr.Big?

Sim, ele mesmo, o Mr. Big a que todas nós, todas sem exceção, estamos condenadas. Hoje, amanhã ou depois.

Acho bastante improvável que alguém não conheça o Mr. Big original, o que assombra a Carrie de Sex and the City. Mas, mesmo que você não faça idéia de quem ele seja, posso resumi-lo: o Mr. Big é, definitivamente, o cara errado. Na verdade, o cara errado para ser feliz para sempre, mas o cara certo para ser muito feliz em alguns momentos.

Se você é homem ou alguma dessas pessoas intelectualmente superiores que não suportam seriados, vou contar o que você precisa saber para continuar lendo este texto. Apesar de ser o cara errado, o Mr. Big não é o cara errado básico. Ele é aquele ser incrivelmente sensual, excepcionalmente charmoso, super interessante, que não chove, nem molha, não caga, nem desocupa a moita, não está lá nem cá. O que te enche de esperanças e some. Misterioso, não deixa nunca que você saiba o que ele realmente pensa a seu respeito (porque prefere te ver sempre encantada com ele, ou, em termos mais diretos e realistas, não quer te tirar do balaio, nem parar de rodar o pratinho).
Ele não é ciumento. Até prefere que você esteja comprometida. Ele não ataca. Nunca. Espera que você tome a iniciativa. E ele faz até a mais contida se jogar.
Ele não se declara. Se fosse famoso, seria daqueles "estamos nos conhecendo melhor". Te deixa sempre imaginando se é um assédio ou não, se está a fim ou não. Sutil, sempre. Porém, está sempre rodeando, aparecendo, marcando o território dele.
O cara que é Mr. Big faz você se sentir sempre a única (o que nunca é o caso), faz você se sentir diferente, flutuante, leve e entorpecida. O Mr. Big é aquele cujo nome, ao aparecer na tela do seu celular, faz parecer que o vibracall está dentro de você, pulando no seu coração. É aquele que, mesmo acompanhado de outra numa festa, dá um jeito de sair de fininho e te dar uma piscadinha que derrete todo o gelo que você levou anos para criar no seu eu interior. O Mr. Big é o efeito estufa na sua calota polar. É aquele que te deixa de orelha roxa.

O Mr. Big é o paquera que vira sigla ou apelido para suas amigas, porque você não quer que o mundo saiba sobre ele. Ele é sempre enigmático, quase mudo, só te olha. Ele não alimenta expectativas de nada mais sério e, por isso, sempre que ele liga, aparece, te chama no msn ou em qualquer outro lugar, faz com que você aceite tê-lo assim, só por um pouquinho. E, assim, é ele quem sempre dá as cartas do jogo, porque, o que você tem com o Mr. Big nunca será um relacionamento. É um caso mal resolvido. Para sempre.

O Mr. Big não é de ninguém e é de todas, mas está, geralmente, sozinho, pois é assim que prefere ser visto. Mesmo acompanhado, tem aquele ar autônomo, independente. E sério. Aliás, ser sério, de um jeito muito sexy, é outra característica marcante desse tipo de homem.

Quando você conta que conversou com ele - absolutamente feliz e realizada - pra uma amiga, ganha bronca, ou, no mínimo, um "não acredito que você conversou com esse idiota de novo".

Mesmo com a bronca, e mesmo sabendo que a amiga está certa, cada uma compreende o seu Mr. Big, até defende a postura deles. A gente é até um pouquinho feliz assim. Com essa inconstância. Com a montanha russa de emoções, com os dois lados da moeda, com o tudo e o nada na mesma pessoa, com esse amor só de expectativa. Loucas e santas, todas as mulheres somos assim (e quem diz isso é a Marta Medeiros). E a gente segue se encantando e se apaixonando e se iludindo e se machucando. Cíclico, como a vida. A gente gosta da segurança insegura que o Mr. Big proporciona.
Se o Mr. Big da sua vida ainda não apareceu, acredite, um dia ele chega. Chega e te derruba, que nem dengue, que nem gripe forte. Você saberá quem é seu Mr. Big no primeiro cruzar de olhos. Se você já sabe quem é (ou foi, quem sabe) o seu, saiba que ele era só isso. Como se ser um Mr. Big na vida de alguém fosse "só"alguma coisa. Pode afirmar: "Nossa, menina, tive um Mr. Big e sobrevivi". Acho que deviam até fazer camisetas assim.
Se todas soubéssemos enquadrar os Mr. Big que nos aparecem nessa categoria, o mundo seria mais calmo, e as psicólogas mais pobres. Anos de análise se resumiriam na seguinte frase: você encontrou seu Mr. Big.
Seria um diagnóstico pesado, incurável, mas, sabendo do que se trata, seria mais fácil lidar com o assunto.
Passada a Big euforia inicial, acredito ser possível guardar o Mr. Big em algum cantinho da alma (poque ele incrusta na alma) e seguir a vida, como se ele nunca tivesse existido, apesar de ser confortável lembrar que ele existiu.
Como os Mr. Big não participam de relacionamentos, eles nunca discutem a relação. Não existe rotina e, sem ela, também não existe cumplicidade, intimidade, entrega. Com os Mr. Big, não pode existir amor. O que, de vez em quando, também pode ser bom.
ATENÇÃO, SE VOCÊ NÃO VIU O FILME SEX AND THE CITY: VOU CONTAR O FINAL!
No filme, só porque era filme, casaram o Mr. Big. Quer dizer, ele foge do casório, mas, depois, acaba casando, com papel passado e tudo. Mas isso só foi possível, porque o seriado acabou e porque, provavelmente não haverá sequência do filme. Seria impraticável a vida a dois com um Mr. Big. O Mr. Big teria que ganhar um nome (que ele até ganha no filme, mas não lembro), teria que perder a pose, o charme e deixar de ser o que ele, de fato, é.
Quanto à pergunta que não quer calar, respondo-a. Não conheço nenhuma Mrs. Big. E é disso que eu tenho medo.