segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Miopia voluntária

Recebi hoje um email da minha avó e, em um dos trechos, ela dizia assim:

"...Vc é uma pievilegiada pois, de acordo com a sua ótica, a sua família só tem qualidades e nenhum defeito: pai, mãe, avós, irmã, sogra etc. Ainda bem! Beijos! Vou ver o Jornal na minha nova TV. Uma belezura! Abraços para Rico. Vó aliviada"

Como eu já tinha contado no post que fiz pra ela, minha avó é uma peça, sempre bem humorada, sempre moderninha e antenada com as novidades e ela manda estes emails que me fazem rir. Hoje, confesso, achei interessante a ótica dela.

Já contei por aqui que sou míope. No úlimo exame tinha 1,5 graus e, desconfio seriamente, que isto está aumentando. Não uso óculos. Morro de preguiça e nunca achei um modelo que me ficasse bem. Me acho muito feia de óculos, então não uso. Além disso, não consigo encostar no meu olho, e nem cogito usar lentes de contato. Por isso, se você um dia me encontrar e eu não te vir, não é fingimento, é cegueira mesmo. Chegue mais perto ou grite meu nome que eu irei em sua direção.

Logo, sendo míope e não usando óculos, não vejo as coisas direito.

Na minha ótica, ninguém é perfeito, todo mundo é meio embaçadinho mesmo e eu sempre mencionei isso nos textos. Meu avô, o das jabuticabas congeladas, é rabugento. Meu pai é crítico, seco e bravo. Minha mãe se desdobra pelos outros, que muitas vezes não fazem nada por ela. Minha avó, como ela mesma confessa, é de veneta, e só faz as coisas quando quer. Passada a fase em que ela fazia empadinhas todos os dias, não adianta pedir, implorar, chorar e fazer beicinho, só sai empadinha se ela estiver com vontade de fazer empadinhas.

Eu falei tudo isso antes, e só estou repetindo agora. Apesar dos defeitos, são pessoas que eu amo muito. O que eu sempre tento escrever é isso: apesar dos defeitos - que todo mundo tem - as pessoas a meu redor tem suas qualidades e eu decidi que nelas estaria o foco. 

Minha escolha, depois de adulta, foi lembrar sempre das qualidades. Não dá pra apagar os defeitos, mas dá pra manter as qualidades em mente, como se fosse um mantra mesmo. Então, toda vez que alguma coisa me aborrece, eu penso: meu pai foi tão grosso, MAS ele deixou o café da manhã todo preparado pra mim, então, às vezes, ele nem notou que foi grosso. Eu espremo meus olhos pra ver as qualidades, ainda que os defeitos estejam mais perto.

Outra coisa que descobri é que as pessoas têm mania de se magoar muito fácil. Eu fui assim por muito tempo, muito mesmo. A amiga ligou primeiro pra outra amiga pra contar que estava namorando? Eu ficava brava, magoada. Pior, a amiga foi tomar sorvete com outra e não me chamou: aquele drama. E não adiantava justificar: Laura, a gente sabia que você estava no estágio! Eu respondia: e se eu não tivesse ido neste dia? Hein, hein? A tia trouxe um creme de baunilha pra minha irmã e um de pêra pra mim, eu achava falta de consideração, porque todas as pessoas do mundo preferem o de baunilha.

Até o dia que eu me achei muito chata e fiquei com a sensação de que eu estava deixando as pessoas a minha volta com medo de mim. Como se elas, em vez de perceberem o quanto eu gostava delas, estivessem começando a perceber só o quanto eu era exigente. Pra ser minha amiga tem que preencher uma série de requisitos... e não é assim. Percebi que eu tinha que deixar claro pras pessoas o quanto eu gosto e preciso delas, independentemente das coisas que, vez ou outra, me deixem meio bravinha. Hoje em dia, eu sinalizo minhas rabugices, mas tento fazer com mais leveza e doçura.

Sem contar que já fui vítima das minhas próprias mágoas, perdendo amigos e, sendo cobrada na mesma medida com que costumava cobrar: uai, quando eu chamei a fulana e não te chamei você briga comigo e, agora, você chama a fulana e não me chama e quer que eu não brigue com você?

Descobri que algumas coisas a gente não muda nunca. Não adianta, meu pai nunca vai escrever uma poesia no meu aniversário, minha mãe nunca vai conseguir desligar um telefonema mais depressa se a pessoa do outro lado está desfiando um rosário de tristezas e desabafos (quando precisamos sair pra não nos atrasarmos para meu aniversário), meu avô não vai responder que está tudo bem, se vc perguntar: e ai, vô, tudo bem?. E minha vó não vai fazer as benditas empadinhas, acho que nunca mais.

Só que, com esses defeitinhos todos, eu consigo conviver, e, no contexto das qualidades, eu acho que eles desaparecem. Como sumiram no contexto dos textos. Eu falei que meu vô é a pessoa mais rabugenta que conheço e, tudo o que me falam do texto é: eu quero alguém que congele as jabuticabas pra mim!!!!!

É claro os defeitos irritam às vezes (às vezes irritam muito), mas, se você já sabe que a pessoa é daquele jeito, você supera a irritação e começa a achar graça.

Essa é a escolha  que eu fiz: ser totalmente míope, por dentro e por fora. E ser feliz, é claro.

6 comentários:

Barbara Chagas disse...

É, vc é ciumenta mesmo com as amigas, MAAAAASSSS...
Ta sempre perto quando a gente precisa! Mesmo quando a gente não precisa, mas quer. Mesmo estando do outro lado do oceano.

Thais Henriques disse...

Fiquei pensando se essa miopia não poderia ser um velho sentimento: AMOR, que faz a gente ver tudo bem melhor do que realmente é.

Sara disse...

Texto lindo Laura!

Julie disse...

Muito bom! tb tento ser assim... é difícil as vezes né... pois sempre acabo aceitando e justificando algumas "chatices" (que cansam e magoam tb) por lembrar quão maiores são as qualidades dos outros. Mas assim se é bem mais feliz mesmo!

Dani disse...

Laura, adorei seu blog e principalmente seu texto, hj to numa TPM daquelas e o q me salvou foi ler o q vc escreveu... e acho q vou parar de usar oculos e ser miope tb hehe bju

Cíntia Mara disse...

Como sempre, adorei o texto, Laura.
Vou me lembrar dele da próxima vez que me estressar com coisa boba. Eu não sou de ficar magoada, mas vivo explodindo :(

Beijos