quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Apertos em geral

"Estou apertada" é uma frase que tem muitos sentidos possíveis. Para entendê-la, é sempre necessário contextualizar.

Estar apertada de dinheiro é horrível; de tempo é sufocante; na roupa é constrangedor; no sapato é doloroso. Porém, nada me parece pior do que estar apertada para ir ao banheiro.

Quando se está apertada de dinheiro, restringe-se a gastança, faz-se um empréstimo, dá-se um jeito.
Apertada de tempo, trabalha-se até sabe-se lá que horas, diminuem-se os compromissos, explica-se às amigas o afastamento.
Apertada na roupa: regime ou assumir que você não veste mais 36 é uma boa saída. Terapia talvez.
Sapato apertado é péssimo, pode acabar com uma festa, com seu humor, com sua unha encravada, mas, fazer o quê? Ir para casa e descansar de pernas pra cima.
Agora, apertada para ir ao banheiro, quando não é possível ir ao banheiro, não tem solução. É o pior e ponto.

Eu, por exemplo, sofro muito com isso. Seguindo rigidamente as instruções de todas as revistas femininas, dermatologistas, amigas e da minha mãe, bebo muita água. Por isso, como já era de se esperar, faço muito xixi. Muito mesmo. Um xixi considerável a cada hora e meia, pelo menos. Porém, como que para compensar o hábito mictórico, tenho o intestino preguiçoso.

Então, no meu corpo, é assim: enquanto os rins trabalham que é uma maravilha, o intestino fica lá, dias, sem dar notícia, pensando se vai fazer o serviço dele, ou se deixa tudo acumular e resolve de uma só vez. Enquanto isso, fico à mercê dessas duas partes de mim, tão complementares e tão diferentes.

Na verdade, além de não trabalhar, meu intestino a-do-ra fazer uma propaganda de que trabalha. Em outras palavras, meu intestino é ruidoso. Assim, se eu como uma coisa mais pesada, minha barriga (alguém mais já pensou que o que a gente comumente chama de barriga é, de fato, o intestino?) faz barulhos altos, nítidos, como se fosse um pum (ou vários puns). Se eu não como nada, também reclama. Quando estou sozinha, ou em casa com meus familiares, isso até é tolerável, mas, em situações públicas, é um horror. Reunião com um cliente. Eu lá, sentada ouvindo, vem o barulhão:

-RRRoaaaaaaaaaaaaaaaaaarrrrrrrr....

Sala de aula. No meio da prova, silêncio total. Lá vem ele:

- RRRRRRRRRRoooooooooooooooaaaaaaaaaaaaaaaaaaarrrrr...

É quase um rugido.

Sempre sorrio amarelo, e logo assumo a autoria, para evitar constrangimentos: "Nossa, me desculpe, minha barriga está com uns problemas, estou fazendo um tratamento super complicado, enfim, dou uma exageradinha básica no meu sofrimento, pra tentar converter o julgamento preliminar das pessoas de nojo para dó. Como um advogado que pleiteia uma pena menor, sabendo da impossibilidade da absolvição.

Enfim, é óbvio que essa minha característica não é exatamente um atrativo para o sexo oposto, e acaba agravando o encalhamento de qualquer mulher, principalmente o meu, no caso.

Tenho um grande amigo que costuma dizer que intestino preguiçoso só existe porque nós, mulheres, somos ensinadas a ser sempre femininas, limpinhas, cheirosas, e, por isso, temos vergonha de fazer o famoso "número 2". Se o resultado fosse rosa e tivesse aroma floral, com certeza, todas as mulheres iam ao banheiro várias vezes ao dia. Porém, sendo marrom e...bem, todo mundo sabe como é, desnecessária uma descrição constrangedora, não é?

Depois de todas essas voltas, o caso é que, há um tempo atrás, notei que meu intestino estava que nem o Dorival Caymmi, preguiçoso há séculos (quase descansando em paz)...

Com isso, minha barriga estava inchada, minha pele péssima e eu, na iminência de passar um fim de semana na praia, tomei uma decisão desesperada. Comprei um laxante.

Achei ótimo, seria uma espécie de lavagem intestinal caseira e a barriga sempre dá aquela diminuída considerável, ótima pra quem quer encarar o biquini sem ter encarado nada de ginástica e dieta. Fui à farmácia e pedi. O moço do balcão, muito solícito, me deu um produto natural que, como disse, era melhor pra pessoas não acostumadas ao método.

Cheguei, em casa, li a bula e, na intimidade máxima do meu banheiro, tomei o medicamento. A indicaçao era de que o "resultado" apareceria em, no máximo, 12 horas. Pensei: são oito da noite agora, oito da manhã vai ser tudo de bom.
Dormi na esperança de um belo despertar, já sentindo as fincadinhas.

No dia, seguinte, acordei e nada. Até fiquei um tempinho sentada pós-xixi, mas nada de ter qualquer vontade. Desesperançada - e pançuda - levantei, maldizendo o farmacêutico que subestimou minhas necessidades de uma dose cavalar. Decidi tomar outro comprimidinho. Aliás, outros.

Em seguida, como em qualquer dia normal, fui trabalhar. O dia agitado, telefonemas, emails, reuniões e, no meio da tarde, uma audiência em uma cidade bem próxima (30km de distância). Sai para audiência logo após o almoço e nada.
Cheguei para a audiência, a minha era a próxima, mas poderia demorar, mas meu intestino, num surto de eficiência, começou a me avisar que já estava trabalhando. As ficadinhas que eu esperava ao acordar eram fincadonas, subitamente, saídas do nada, surgidas do meu almoço super apressado e da combinação, sem trocadilhos, explosiva dos comprimidinhos...Fui perguntar onde era o banheiro mais próximo.
Aha! Como não podia deixar de ser em casos como esse, o banheiro mais próximo não era tão próximo, aliás, era em outro andar, e eu não podia sair dali, e correr o risco de perder a audiência. Comecei a suar, no princípio timidamente, depois abri um botão do casaquinho, depois tirei o casaquinho. Comecei a suar frio. Minha visão estava meio turva, ânsias de vômito e mais suadeira. Passados uns 10 eternos minutos da mais pura aflição gastro-intestinal, finalmente, chamaram a audiência que, pelo menos, foi rápida...sinceramente, nem sei direito o que assinei, foi meio no piloto automático, nem conseguia sorrir mais...
Tão logo sai da sala, acho que me teletransportei para o banheiro (masculino, como descobri ao entrar e ver a tampa levantada com inevitáveis respingos e pêlos - eca!) e sem papel (por isso que é bom bolsa de mulher, logo achei um absorvente e um pacotinho de lencinhos umedecidos, que salvaram meu dia).
Sai, aliviada, na inocência de quem realmente não está acostumada a laxantes e ainda não sabem do que eles são capazes.
Entrei no carro, liguei e fui, levíssima, dirigindo (mal, como de costume).
No meio da estrada, quando ainda faltavam uns 15 quilômetros para minha casa, outra fincada. Fingi que não era comigo, que nem tinha notado. Ela insistiu. Era comigo. De repente, uma obra na estrada. A fila que era tripla fica única. Novas fincadas. Nova suadeira. Tirei o casaquinho de vez, os sapatos, prendi os cabelos, desabotoei a calça...
E agora, não tinha para onde correr, nem para onde ir. Nenhum matinho próximo, minha saída seria rezar.
Qual o santo adequado para situações como essa? O das causas impossíveis? A desatadora dos nós eu achei que não, porque precisava era atar um nó e não desatar nada. Santo Antônio? Sem chance, meu santo vip não merece me ver nessa situação. Considerando que o "tempo fechou"pro meu lado, poderia apelar metaforicamente para São Pedro...rezando, respirando e andando um metro a cada minuto...
Não preciso narrar tudo, mas uma dúvida é eterna: por que quanto mais perto estamos do banheiro, mais a vontade fica insuportável?
Continuei, dignamente, na minha auto-preservação, segurando o que podia e o que não podia, me superando mesmo. Quando, finalmente, cheguei em casa, a sensação foi de glória. Juro que ouvi "Carruagens de fogo"ao fundo.
Minha chegada foi gloriosa, íntegra e meu banheiro me aguardava limpinho e com papel.
O laxante mostrou serviço, meu intestino nunca trabalhou tanto na vida. Os rins devem até ter ficado com inveja. Porém, sinceramente, descobri que tudo funciona como tem que ser. Inclusive quando não funciona.









7 comentários:

Catiluva disse...

Cada vez adoro mais este blog! Sou tua fã. Agora sério, você já penso em fazer uma sinopse da Bonitona Encalhada para uma sitcom? Eu ia ser a primeira a sentar em frente à TV. Dá até uma invejazinha, quem dera escrever assim, com tanto humor. E o melhor é que eu me revejo em quase todas essas histórias! Tudo de bom. Bjos

Beca disse...

Hahaha, Laura, essas histórias são de rir pra não chorar, né?? Espero que seu fim de semana na praia seja mais tranquilo e sem maiores problemas - mesmo que isso resulte em menos histórias pra contar, hehe.

Abraços!

Rafaela Porcaro disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Rafaela Porcaro disse...

Toma duas colheres de linhaça todo dia de manhã e resolve seu problema em definitivo. Bonitona, encalhada e cagada? kkkkkkkkkkk

Barbara Chagas disse...

Hahahahaha
Laura, parabéns pela coragem de relatar seu bloqueio intestinal em rede (aliás, web) mundial!
Muito divertido!
Bjos
ps: Adorei o presente! Já usei e fez mto sucesso!

Rafaela Porcaro disse...

Faz o desafio Activia. Se tudo der certo, após 30 dias, além do seu intestino estar funcionando a pleno vapor, você ainda ganha um marinex!!!!!

A. Ilha disse...

Foi bem por acaso que vim parar no teu blogue. Um acaso agradável, literariamente falando! Até então nunca tinha imaginado alguém falar sobre esse assunto com tamanha leveza, e de forma que não se pudesse parar de ler. Adorei tua escrita!

Agora, realmente, que situação!...

Um abraço!
Muito sucesso por aqui e no mundo não-virtual também!