Depois do acidente com o motoqueiro, pedi ajuda às universitárias, todas minhas amigas, e encomendei um encontro às escuras. E atire a primeira pedra quem nunca aceitou participar de um evento desses.
Pois bem. Na verdade, eu pré-aprovei o candidato. Tinha conhecido-o preliminarmente num churrasco na casa da minha amiga (a que ia providenciar tudo), e achei que ele era bonitinho, expansivo, conversado, enfim, tinha chances de dar certo.
Naquele tempo, eu ainda não tinha uma definição do que seria dar certo e nem maturidade para entender alguns sinais óbvios e evidentes. Em geral, hoje, posso dizer que homem expansivo demais, hum, é expansivo demais.
Em tempos de David Beckham e outros ícones maravilhosos da metrossexualidade, eu confesso, se vendessem homem em concessionária, o meu ia ser bem básico, quase sem opcionais. Desodorante, perfuminho, unha limpinha, orelhas idem, cabelo em ordem, pança discreta e só. De resto, não gosto de homem com muito frufru (pânico absoluto de unha feita e com base, mil e duzentos adereços dourados, escova progressiva, cabelo muito estiloso ou, pior ainda, com qualquer tipo de luzes, mechas ou tintura).
Só que, às vezes, os sinais não são tão evidentes, e lá fui eu, totalmente desavisada, pro meu encontro. Chegando no local (um barzinho, básico, bem normal), o expansivão começou a tagarelar. Eu ouvia, ouvia, ouvia e pensava: "Deus, será que tenho que levantar a mão pra falar?"
O moço, encantado com ele mesmo, resolveu, enfim, me dar a chance de participar do que até então havia sido um monólogo:
- Aqui, mas você tem preconceito com homem que se arruma?
-Eu? De jeito nenhum.
- Ah, pois é, porque eu me cuido mesmo! Acho um absurdo sair com o cabelo de qualquer jeito, sabe? Olho vitrines, pesquiso tendências, agora por exemplo, tô adorando umas calças pescador de tactel, com sandália de couro, blá, blá, blá...
Nesse momento, meu radar interno de frias já disparou. Como assim pesquisa tendências? Achei esquisito, mas continuei ouvindo (já que nada mais me restava a fazer mesmo)... E ele:
- Então, ai, estava muito gordo, resolvi fazer uma dieta nova, vi na Boa Forma...Menina, minha barriga tava igual uma pochete, tipo uma bóia... Mas agora tá assim - levantou a camisa e mostrou a barriga!!! - MA-RA-VI-LHO-SA!
E eu pensando: menina? leu na Boa Forma? Dividiu em sílabas?
É como recomenda "A Profecia Celestina": preste atenção nos sinais. Ele gostava de pesquisar tendências, lia Boa Forma, me chamou de "menina", dividiu em sílabas... E prosseguiu com sua metralhadora falatória:
- Então, vou morar na Espanha seis meses para aprimorar meu espanhol. Tendria que no tener pancita ninguna! Hablas espanhol, chica? (gesticulando, e aumentando o tom de voz) Pois yo hablo muuuuuuuy bien.
Tive a impresssão de que as pessoas ao lado começavam a me olhar. O radar orelha disparou. Quente e roxa instantaneamente. Depois de uns 40 minutos, minha amiga (noiva, pra variar)chega com o namorado. Meu par estava numa euforia incontida:
- Noivaaaaaa. Acho tudo essa mulher! Adoro casamento. Porque, meu filme preferido, é "Um lugar chamado Notting Hill", e au amo aquela música "She", sempre me imagino dançando como a primeira música dos noivos.
Nesse instante, arregalei os olhos para minha amiga, condenando-a para sempre: como é que você me indica isso, meu olhar gritava com ela. Ela desviou o olhar, fugindo da minha bronca olhística. Tudo bem que meu filme preferido também é "Um lugar Chamado Notting Hill" e eu também imaginava "She", mas essa não era exatamente a coisa que eu esperava ter em comum com um pretendente.
A partir desse momento, aproveitei-me da presença de outra fêmea para evitar o moço. Depois de algumas doses (dele, obviamente, pois evitei qualquer bebida que atrapalhasse meus reflexos), evitar um beijo era quase como lutar com o Neo no Matrix. Minha coluna já estava estalando. Pensei em implantar qualquer sujo no dente, pra ver se o moço ficava com nojo, mas não estávamos comendo nada (pela Boa Forma, nada no cardápio do barzinho era adequado).
Enfim, depois de muito esforço, resolvi jogar um papo acabei-de-terminar-e-não-estou-pronta-para-um-novo-amor e deu certo. Decidimos ir embora.
O pior, pra variar, ainda estava reservado para dentro do carro.
Silêncio, finalmente. Ele pergunta se eu me incomodo de ligar o som. Não me incomodo. O som estava assim, vibrando até meus cabelos. Não ouvia nada. O carro era praticamente um trio elétrico, só que com música de boate.
Meu acompanhante, aos berros, tenta conversar:
- E ai, Laura, você gosta de dançar?
Eu também aos berros:
- Gosto.
Juro que ouvi a frase a seguir, mas, considerando o volume do som, pode ser que eu esteja enganada:
-Nossa, eu amo dançar. Às vezes, vou sozinho pra boate. E ME REALIZO NA PISTA DE DANÇA.
Pra quem não é fera em inglês, "realize", em inglês, é perceber. Então, depois dessa, quem realizou tudo fui eu. Agora, esse encontro às escuras estava totalmente às claras. Pensei: gente, se esse aqui não é, é com certeza o primeiro da fila. E já que a fila que ele estava não era pra me namorar, sai bem rapidinho do carro que, pelo menos dessa vez, estava em perfeito estado.
5 comentários:
Você está cada vez melhor e as histórias cada vez mais engraçadas. Acredito que este rapaz a esta altura já deve ter se encontrado MA-RA-VI-LHO-SA-MEN-TE!!!
Parabéns!!! Você vai longe!
KAKAKAKA
Essa já é clássica!
E o pior é que ele ainda é o primeiro da fila até hj!!
hahahahahaha...ai, nunca ri tanto! É muito azar! Você não teve vontade de rir na cara dele, n? Eu teria...já encontrei mtos tipos desses, daqueles que eu olho para a minha amiga e pergunto "é ou não é?". A-DO-RO este blog!
Gente... acho que pior que moço é essa sua amiga hein!! Que falta de sensibilidade a dela! Tirando isso, mais uma vez você quase me matou de rir!! bjokass lov you
só uma perguntinha: essa criatura em questão não é G-A-Y ??????
hahahah...
adorei esse post!
bjs
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